sábado, agosto 03, 2013

As tribos da Esquerda

Sou de esquerda, o que isso significa? Muitos tentarão conceituar, uns conforme sua cartilha, suas teses e outros de acordo com a conjuntura e a relação de forças. As manifestações que tomaram o Brasil são tocadas por grupos de esquerda, coletivos e partidos que estão a esquerda do governo federal, acompanhados de alguns grupos que estão inseridos nele. Soma-se ainda os anarquistas anticapitalistas. 
Todo esse grupo, com o qual me identifico,  apesar de fazer barulho e lutar, não é estatisticamente representativo na sua quantidade, o que por si só já seria motivo para se unificar de alguma maneira.

Aí começa o problema.

O comentário que segue não pretende justificar o porquê não sou filiado a nenhum partido nem levanto bandeira de grupo específico, mas explica em muitos aspectos.
Todos os partidos e coletivos que vou mencionar são do campo político que circulo, com quem acho o diálogo produtivo e respeito muito suas trajetórias e lutas.

Essa análise é superficial de caso pensado.

Costumo dizer que a esquerda não se une nem pra salvar a mãe.

Coisas que vi: bom, o PSTU no momento "bate boca" com o PSOL e com os anarquistas do Black Bloc, diz que o primeiro pelegueia e não concorda com a estratégia do segundo. O PSOL nasceu com tendências que já se configuram em mini partidos, conheci pessoas que não se falam entre elas sendo filiadas no mesmo partido. O PCB, apesar das profundas interpretações do real, "bate boca" com a "marcha das vadias" em Brasília e já o fez com o MST, além de brigar entre si. O MST inserido no governo briga com o MST que se quer mais independente. 
Dentro do PT há inúmeros militantes honrados, conheço muitos da corrente do Trabalho entre outras, mas eles são excluídos dos processos quando se apresentam como tal, se revestem de "Levante da Juventude" porque talvez com outro nome não sejam tão julgados pelos "verdadeiros revolucionários". Por outro lado, os petistas não compõe com o PSOL porque este é "sectário" e constituído por vários grupos e isso não representa unidade suficiente para confiar. 

As disputas entram na ceara da subjetividade e dos detalhes, competem por quem fala mais alto nas reuniões, quem interrompe mais os outros, quem parece mais bravo, quem tem a estética mais revolucionária, quem aparenta ser mais radical no discurso. Encontram razões pequenas para viverem o prazer da divergência, da animosidade juvenil que produz adrenalina, se debatem pra ver quem é mais trotskista, quem interpreta melhor a Ideologia Alemã ou a Contribuição à Crítica da Economia Política. Não me refiro aqui a teoria marxiana e sim a quem a reivindica como sua, em alguns caso, tendo lido muito pouco.

Os julgamentos são acelerados, esse é pelego cooptado, aquele é sectário, tal grupo é centralizado, o outro aparelha tudo, o fulano quer se lançar pessoalmente, o ciclano é garoto de recado e por aí vai.

Diante de tudo isso a sinceridade das relações vai definhando, siglas mentem pra outras siglas, o antigovernismo cego e panfletário vence a construção possível de uma oposição séria e embasada, pautada em análises reais e não oportunistas. Cada grupo faz seu manifesto, seu jornalzinho, trocam cartas e farpas entre si, ao invés de responder à direita e à elite, se enfrentam em saladas argumentativas estéreis.

Isso cansa muito, enoja muito, emburrece muito, separa muito e desgasta qualquer desejo de se vincular. PSTU, PSOL, PCB, parte da oposição interna do PT, Coletivos (que estão na moda) vinculados a esses partidos brigam internamente e entre si. Quando conseguirão olhar pra fora e notar que literalmente (e infelizmente) são meia dúzia, que a esmagadora maioria da população ou não sabe que eles existem ou não entendem o que representam realmente? O que é uma pena. 

 Meus colegas, muitos alunos e alunas, amigos pensam se tratar de um monte de lunático que quer ser contra tudo que existe só por ser contra e deseja transformar o Brasil em uma comunidade primitiva. Essas pessoas do meu meio têm acesso a informação formal,  todavia, imaginamos agora os 53,5%  (IBGE, 2011) da população do país que não acessa ou nunca acessou a internet, por exemplo.

Triste, simples e patético, mas é isso que ouço e percebo.

Por isso realmente não me importa a agremiação para dialogar e construir, é com o ser humano na sua incompletude que se dá o encontro, os grupos são parte da maneira como nossa espécie se organiza, entendo, mas não deviam ser limitadores da ação e da unidade necessária diante de determinado contexto.

Se a sua luta e a minha forem por algo melhor para a sociedade vamos tocá-la, do jeito mais racional e, principalmente, do modo mais passível de conseguir avanços, mesmo que de pequeno porte. Alguém tem que ir até o limite da tensão para conquistar algo concreto, na política saber esse limite para sempre avançar é o maior desafio. Esse limite não pode ser arrebentado e ultrapassado com base em uma "análise de conjuntura realmente marxista" nem deve ser freado com base em conveniências particulares. Ambas ações descaracterizam e enfraquecem a luta. 

Esse relato se refere ao meu pequeno universo, trata de rusgas que a direita não cultiva, de métodos que a elite não utiliza. 

Criar uma frente de esquerda para disputa eleitoral é o menor dos desafios, o problema está no dia a dia, nos movimentos sociais, nos sindicatos, nas entidades estudantis e nas instituições. 

As posturas e o trato conquistam mais as pessoas do que grito de ordem e a repetição das teses 8 e 11 do Marx.

A forma, que canaliza o conteúdo, é o meio pelo qual não seremos estigmatizados antes de sermos ouvidos.

Há um gigante desafio pela frente, os militantes de esquerda estão protagonizando a única luta que pode mudar a sociedade, me filio de cabeça nessa luta, mas temos que pensar nesse modus operandi casmurro, para não vivermos mais um século sendo vanguarda que nada guarda ou sendo células que só falam com seu núcleo e ainda assim com dificuldade.

Gregório Grisa

3 comentários:

Anônimo disse...

É por essas e outras que estou, seguidamente, comentando com meus amigos de que a "esquerda" inexiste no Brasil e é exatamente disso que a elite capitalista precisa pra continuar no "domínio" da situação. A quebra de todos os partidos de "esquerda".

Anônimo disse...

Não me identifiquei anteriormente, Grisa, sou Osvaldo e fomos, praticamente, colegas na UERGS, Alegrete...

jose grisa disse...

"Só uma direção político-partidária, um centro com métodos partidários, isto é, uma vanguarda política - não falamos de unicidade partidária, mas de uma conjunção baseada num programa - é capaz de redirecionar o processo e torná-lo na revolução que construa uma nova ordem social. Nisto não nos move nenhum exclusivismo vanguardista e negador do enorme potencial revolucionário das organizações sociais orientadas com métodos, disciplina e concepção científica.” (Marcos Domich, professor na Universidade de La Paz, Bolívia)
uma reflexão.