segunda-feira, julho 01, 2013

Médicos brasileiros e/ou estrangeiros no interior e nas periferias.

Pensando sobre a forte resistência das entidades representativas da classe médica acerca da proposta do ministério da saúde de lançar edital em busca de médicos brasileiros e/ou estrangeiros para trabalhar no interior do país e nas periferias das metrópoles, me reportei ao tema das cotas nas universidades. Um argumento recorrente é muito similar nas duas questões, qual seja:

"Ações como essas não resolverão, o problemas está na base, tem de se melhorar a infraestrutura, a carreira profissional e se investir maior porcentagem do PIB na educação básica, ou na saúde básica. Essas medidas são eleitoreiras e não atacam a essência do problema". 

Apesar de não conseguir identificar contradição entre medidas como a desse edital e um grande investimento estrutural em saúde, vale dizer repetidamente que uma ação não exclui a outra. O argumento acima, que já se esvaiu no que tange as cotas, se esvazia quando não considera a processualidade do mundo real. Mudanças estruturais que envolvem planejamento e um câmbio até cultural, não ocorrem do dia para a noite, todavia, as doenças sim. 

Assim como não podemos dizer para a atual geração de estudantes de ensino público e para as famílias negras para que esperem duas ou três gerações mais para acessarem o ensino superior, pois estamos qualificando a educação básica, é desumano dizer para que as pessoas em busca de tratamento médico agora em milhares de cidades aguardem enquanto se resolve a questão de infraestrutura, plano de carreira e investimento em saúde. 

Há um corporativismo que beira a teimosia nesse caso, apesar da necessária qualificação e valorização dos médicos no Brasil é preciso dizer que essa é a profissão com maior prestígio social que existe, haja vista, a grande disputa para o ingresso em cursos de medicina nas universidades. Esse edital de caráter emergencial irá ser lançado até o fim do ano porque no início de 2013, o governo lançou o segundo edital do Provab para atrair 13 mil médicos na atenção básica – um pedido de prefeitos brasileiros -, mas apenas 3.800 se inscreveram no programa que paga R$ 8 mil mensais aos interessados e oferece especialização. Um professor universitário recém concursado com doutorado não ganha isso. 

Correndo o risco de ser mal compreendido cabe dizer que a elitização é uma característica da medicina no Brasil, nossa cultura encara o curso de medicina como porta para a riqueza, para o sucesso material (acúmulo financeiro) o que todos desejam no modelo de sociedade que vivemos. Com isso não estou falando que médicos são gananciosos por natureza ou generalizando a medicina como uma profissão de soberba, conheço médicos e médicas incríveis e acredito que a maioria dos profissionais são sérios. A medicina privada imersa na lógica do profissional liberal é a regra e não a exceção. 

Diante disso ouvi além de argumentos questionáveis algumas manipulações no que se refere aos dados da saúde pública. Por essa razão vamos aos números. 

- Segundo o Ministério da Saúde, há um déficit acumulado de 54 mil postos de trabalho vagos para os médicos no Brasil nos últimos dez anos. 146 mil postos foram criados enquanto 93,1 mil profissionais se formarão em medicina nesse período. É verdade que há de se expandir as vagas em cursos de medicina e que aqueles que ocupam vagas públicas teriam de dar algum retorno para o SUS depois de formados. 

- Segundo o Ministério da Saúde 1581 cidades não contam com nenhum médico da atenção básica

Argumento falso de que "não faltam médicos do Brasil" não corresponde com a verdade. Faltam sim. Entidades médicas teimam como o IBGE, com o IPEA e afirmam que o governo está desinformado sobre a realidade. Isso não vale comentários. 

Sobre o edital que irá ser aberto em caráter de emergência:

Serão 9 mil vagas, serão convocados médicos brasileiros para essas áreas periféricas, onde terão acompanhamento permanente de universidades federais públicas. Somente as vagas não preenchidas por brasileiros serão complementadas por estrangeiros. Dentre os estrangeiros serão priorizados médicos portugueses, espanhóis e argentinos porque nesses países a oferta médica é muito superior ao Brasil. Para atuarem aqui, eles receberão uma licença especial com prazo de três anos de duração. Terão de atuar em local específico – as áreas pobres e periféricas do país. Eles também serão acompanhados por “tutores” de universidades federais e deverão se especializar em saúde da família.

Os médicos brasileiros irão para o interior e periferias como fazem professores, enfermeiros, assistentes sociais também sem condições justas de trabalho e salários degradantes? Mesmo que diante do salário da esmagadora maioria dos trabalhadores brasileiros, os salários oferecidos para médicos não é degradante.  

A saúde é um direito fundamental, e as pessoas pobres desses lugares que faltam médicos tem seus organismos iguais aos nossos e na maioria das vezes mais vulneráveis, os segundos, os minutos passam, mas as dores, a angustia não. Todos queremos mais investimentos para saúde, melhores hospitais e valorização profissional, infelizmente isso demora e enquanto se luta por isso é bom olhar para outras profissões e para aqueles que sempre estiveram sem assistência médica cuja doença e morte naturalizamos como mais uma estatísticas.

Gregório Grisa

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