segunda-feira, agosto 06, 2012

Sobre os últimos dias

Nos debates das últimas semanas sobre a renovação das cotas na UFRGS tenho ouvido muitas coisas. A mídia em geral tem um foco de interesse muito restrito sobre o tema, querem saber do desempenho dos alunos cotistas, quanto tempo a política vai durar e quais são as principais controvérsias . Parece que notícias polêmicas vendem mais e logo merecem prioridade por essa lógica. A sociedade quando trata do tema centra suas forças na defasada dicotomia do ser contra ou a favor de cotas. E quando se fala de cotas para negros essa conversa ganha ares apaixonados que impedem um aprofundamento necessário. Isso ocorre com outros assuntos como o aborto, a descriminalização das drogas e a crença em Deus, por exemplo.
Dentro da universidade o estágio do debate sobre Ações Afirmativas é diferente daquele que vemos nos meios de comunicação e na sociedade em geral. Mesmo entre os setores que historicamente são reconhecidos como conservadores e politicamente de direita há certo concenso que essas são políticas públicas de Estado. Esse estágio do debate faz com que as modalidades da política, os grupos focos das cotas e questões de permanência dos alunos sejam agora os desafios colocados para a universidade.
Vou destacar um caso que ocorreu em uma das conversas que tive na imprensa para ilustrar o pensamento que considero muito clichê sobre esse tema. Um comentarista ao me perguntar sobre as cotas afirmou (o cansativo argumento) que está se atacando os efeitos ao se instituir cotas nas universidades e que o correto é investir no ensino básico, que seriam as causas. Ponderei que a política de cotas não se contradiz com um grande investimento no ensino básico e que inclusive tenta impulsioná-lo indiretamente. A universidade não tem ingerência direta sobre o ensino básico, não se investe grande quantia de dinheiro público ao se instituir cotas e essas políticas atacam diretamente outros problemas sociais logo, não serpa e nem pretende ser resolutiva de questão tão macro.
O argumento usado pelo comentarista é o famoso "usar do não feito para não fazer", mas infelizmente convence muita gente. Destaquei que cotas pretendem promover a diversidade étnico racial no ensino superior, lugar onde há pouca pluralidade. Fui chamado de racista pelo comentarista que afirmou que "defender cotas para negros é assumir que eles são inferiores".  Esse tom emocional, a que me referi acima, veio a tona em boa hora porque tive como responder com uma pergunta. Assumir que os negros são inferiores é propor políticas que os incluam no ensino superior, diante da flagrante desigualdade étno-racial nas universidades ou naturalizar a sua não presença nesses espaços no último século? Se se aceita que durante as décadas de história da universidade brasileira os negros não conseguiram entrar através de uma "disputa justa" pelo vestibular (sem cotas) não é isso sim reproduzir a ideia de que os mesmos são inferiores?
Essa superficialidade do debate personalizada por esse comentarista que reduz a complexidade da formação social do Brasil, do racismo, da história da educação e da confecção, naturalização e reprodução das desigualdades é que deve ser combatida.
 A ideia aqui era de trazer um relato breve da vivência dos últimos dias e dividir angustias e aprendizados.

Um comentário:

Ricardo disse...

E outra dúvida, pois li o relatório do consum que sugeriu um aumento para 50% de cotas, que seria criado um conselho de acompanhamento destes alunos ingressos pelo sistema de cotas. Esse conselho vai interferir na ação do professor avaliador? Esse conselho vai influenciar o professor a diminuir a exigência em sala de aula? Pelo comentário da não-preocupação com o egresso da universidade, parece-me que sim?