quarta-feira, setembro 15, 2010

Eleições

Aula magna do departamento de humanidades da universidade. A rouquidão não iria incomodar Alfredo, já que a audição seria o sentido a usar. Ainda com sono, não acostumado a atividades diurnas, o rapaz se dirigia ao salão de atos e tinha como companhia passos de pessoas de várias áreas do conhecimento, haja vista o tema da palestra, “Literatura e eleições”. Era um período de efervescência política e nosso estudante de letras não acumulava informação e simpatia pelo processo corrente.

Barba branca e rala, calça de veludo, camisa polo e sandálias era a estirpe do despojado professor responsável pela aula. Durante a interessante fala a plateia se manteve atenciosa, os vínculos entre escritores clássicos e o cotidiano contemporâneo, a poesia e as relações políticas forjaram de sapiência àquela hora e meia.

- Walter Benjamin, um dos maiores críticos literários da história, no livro Passagens faz constantes referências a Baudelaire (poeta francês) e o tem como o pai da poesia moderna, aquele que melhor compreendeu as mudanças radicais da sensibilidade humana advindas com as grandes metrópoles e a revolução industrial.

Falas como essas do palestrante provocaram significativa curiosidade epistemológica em Alfredo, que apesar de ter dificuldade de relacionar aquilo com as chatas eleições se mostrava acessível. Se levantando para sair, já na parte das perguntas, Alfredo avista sua professora favorita que já com o microfone fazia uma indagação ao professor, a pergunta parecia uma dúvida que Alfredo tinha, mas que seu cérebro ainda não conseguira formular.

Como fazem aqueles que encaram a política como uma chatice e uma perda de tempo, que vivem o senso-comum para escolher adequadamente seus candidatos? A resposta do palestrante:

- a primeira coisa que se tem a fazer para optar é se perguntar o que quero para o mundo e para a sociedade realmente, respondido isso pergunte, isso é o que eu quero ou o que quero que os outros pensem que eu quero? Porque que eu quero isso para a sociedade? Quem me fez pensar assim? Qual a influência do que meus amigos querem sobre o que eu quero, ou penso que quero? Não são questões simples, mas se realmente descobrir o que quer para a sociedade, se dará conta que a maioria dos candidatos potenciais vencedores e a maioria das pessoas que formam sua opinião não darão conta de fazer o que você quer.

Alfredo, parado de pé incomodando a visão das pessoas sentadas, boquiaberto nem ouvia os reclames por tal fato, terminou de ouvir a resposta e tomou o rumo da saída emburrado e tristonho, o primeiro por descobrir que, apesar da formação, vive no senso-comum e o segundo por achar que sua professora podia pensar isso dele, o que acabaria com suas chances já platônicas.

Um comentário:

rosane grisa disse...

Não para de escrever e guarda o que está produzindo. Muito bom!Beijos.